segunda-feira, 30 de agosto de 2021

POEMA - CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE NO PURGATÓRIO

 

CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE NO PURGATÓRIO

I

A tarde fecha-se nas faces tisnadas dos operários,

Dos comerciários, dos estudantes, dos vendedores,

Empregadinhas que trabalham a dias,

Professores, motoristas, o menino engraxate.

Meu Deus! estão cansados, estão, sobretudo cansados,

E anseiam a lua, mas a lua é quarto minguante,

E anseiam a noite, mas a noite será sem cinema,

A noite será sem albumina, sem o amor que consola.

A noite virá como uma lápide e pesará sobre os corpos.

E os homens que voltam para casa não são os homens que se irmanam,

Não são os homens que canalizam os rios, que drenam os pântanos,

Os homens que erguem arranha-céus, que fundam liturgias,

Nem os homens que voaram para a lua, que colonizaram a lua,

Esses que voltam para casa não construíram as pirâmides milenárias,

Não impuseram ao Cristo sua cruz.

Estes são os homens cuja foice totalitária cevou todo sonho,

Estes são os homens cuja águia hiperbórea esbulha sempre,

Estes são os homens que segam nuvens, que segam o vento.

 

II

Na lama, na imundície humílima,

Cresce, vem do imo da terra,

Flor sem raiz, lírio timorato.

Rasga, fende o asfalto, revela-se,

Cresce em sigilo entre as gretas do chão

E o recanto guardado da calçada,

Mãos não o colhe, todas as mãos estão vazias,

Nunca será feixe de lírios,

Será apenas uma flor, vaga,

Crescerá, viverá até um dia,

Depois morrerá e secarão as pétalas,

Será pó, desaparecerá. Depois

Dirá um – naquele meio-fio da rodovia nasceu uma flor

Depois essa flor cresceu e morreu

Mas no subsolo uterino ainda se conservam seus bulbos.

 

III

 

Os homens cansados, a flor timorata, o livro já muito antigo,

Revelam os pensamentos de um morto,

De alguém que veio de Minas, que faiscou ouro nas lavras

Da Rua Joaquim Nabuco, 81,

Que só achando pirita se disse -

“Joeirarei o ferro em Ipanema”.

 

 

IV

O morto és tu Carlos.

Tira os óculos,

Sopesa os grânulos,

Pensa o poema,

Pseudomorfose,

Silencia a palavra

Fecha-a nos dicionários.

 

Começa a chover lá fora,

A água desce nas ruas,

Lima as pedras, lima a dor,

Vêm de longe um grito,

Munch? Maiakovski?

O homem que cai?

Ataque de tigre?

Tigre. Tigre. Tigre.

Setembro na capital da república.

Quando será amanhã?

 

Virá uma sombra e será noite,

Tudo isto acontecerá quando acabar à tarde,

Quando os homens descobrirem o relógio parado,

Quando se fizer silêncio

E lá na madrugada espessa e sem lume

Começar a se ouvir ainda não audível

Um canto.

Teu espírito sem volume e sem forma,

Uma névoa, uma inscrição ígnea no beco.


 


 

 

 

 

segunda-feira, 23 de agosto de 2021

POEMA: RETÁBULO PARA JORGE DE LIMA

 RETÁBULO PARA JORGE DE LIMA

Decerto teu canto é negro,

Sabe a nênia iorubá,

Mamou nos peitos de Celidônia

Cresceu na lama glabra do Mundaú.

 

Escrever em ti era polir o verso no madeiro da cruz,

Harpa devota, escrever em ti era reza, era salmo.

Salmodias o homem que se distribui em pão, em leite, em mel,

Salmodias a mulher, carne e anjo, apedrejada, redimida.

 

Teu poema que é reza, que é consolação,

Que é súmula contra a exploração do homem pelo homem,

Que é Hagiografia, que é ara, lâmpada marinha.

 

Ressuscitaste, ó Jorge! o lázaro Orfeu,

Escrever em ti era crer, morrer era nascer infinito.

 

Caricatura do poeta Jorge de Lima


 


 

sábado, 21 de agosto de 2021

MILAGRES, NOSSA TERRA CARIRI

 

MILAGRES, NOSSA TERRA CARIRI


            O livro é a história do município de Milagres, cidade do Cariri Cearense desde seus primeiros tempos coloniais até as primeiras décadas do século XXI. O texto apresenta elementos da história local inseridos na história nacional, isto é, procura sempre inserir Milagres nos eventos da história do Brasil. 


 Fatos históricos como o Massacre da Serra da Cachorra Morta e o Abolicionismo no Ceará são aqui problematizados para que o leitor compreenda o quanto os acontecimentos históricos regionais se entrelaçam com os fatos da história geral e do Brasil.